sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Ausência Expressionista (Arco Ascendente)

Como um louco
Um desvairado consciente
Um policial noir da zona leste
Num dia de sol poente
Tarde luminosa
De crepúsculo esfaimado
Juntei numa tralha
Meus estorvos tecnológicos
Joguei no terreno baldio
Meti o pé em cima, ergui o braço
E gritei para que me ouvissem:

- Tecnologia de bosta
- Do marketing agressivo
- Das crueldades de mercado
- Das transnacionais escravocratas
- Das hipocrisias constituídas

Gritei aos meus vizinhos
De quarenta anos vividos
Pobres como eu
Periféricos como eu
Cultos e incultos como eu
Pedi ao meu Deus
Que não me considerasse blasfemo
Pedi aos meus amigos
Que me abandonassem um pouco
Pedi aos meus filhos
Que me compreendessem mais
Pedi a minha mulher que se calasse um minuto
E depositei em meus ombros
Responsabilidades vicinais

Não quero saber da áfrica
Não quero saber da Ásia
Não me interessam tsunamis
E pobres afogados na fome
Pouco me importa a globalização
Estou cansado, muito cansado
E tenho vontade de chorar
Mas sou fodido macho de bordoadas
De não sentir dor qualquer

Interessa-me apenas o que sou
Estou farto, mas não gasto
Não sinto gastura qualquer que me encrua
Sinto-me livre como nunca

O que sinto é uma ausência
De terras e árvores e águas com peixes
E pássaros que cantam
E cigarras vespertinas e vagalumes
E grilos incautos e grelos noturnos perfumantes
E ruas sem asfalto e sem calçadas
E músicas e tintas do tempo
Que se consideravam arte
Alimentos de almas refinadas

Sinto um vazio de algo
Que não sei explicar
Não sinto medo, sinto ausência
Sentir ausência é pior
Do que sentir qualquer outra coisa.

Devo continuar estes versos?
Não terminaria nunca...
Pois o que sinto não tem começo
Tampouco fim.

Há um sentir apenas
Coisa errante - e pronto.


j. a. pelegrina, 10/11/2009

Nenhum comentário: